RMC busca opções para driblar ‘apagão’ de mão de obra

Pesquisa do Ciesp mostra que empresas têm dificuldade para achar funcionários

Edimarcio A. Monteiro/edimarcio.augusto@rac.com.br

13/04/2025 às 13:24 , atualizado em 13/04/2025 às 13:39

O apagão na mão de obra levou empresas da Região Metropolitana de Campinas (RMC) a buscar alternativas e flexibilizar as regras para preencher as vagas oferecidas. Uma sondagem divulgada esta semana pelo Centro das Indústrias do Estado São Paulo (Ciesp) Regional Campinas apontou que 50% das empresas participantes enfrentam dificuldades para contratar funcionários, desde o chão de fábrica até cargos com alto grau de especialização, o que se tornou um gargalo para aumentar a produção em uma região com um Produto Interno Bruto (PIB) estimado de US$ 50 bilhões (R$ 292,35 bilhões), com participação de 7,9% no índice paulista e 2,3% do nacional.

A entidade representa empresas de uma gama variada de setores, entre eles metalurgia, farmacêutico, alimentos, têxtil, mobiliário e eletroeletrônico. A dificuldade para contratar ocorre mesmo com o segmento pagando salário médio de R$ 2.922, valor 30,62% superior em relação a média dos contratados em geral – R$ 2.237. Para enfrentar esse cenário, a maior empresas de alimentos do país e uma das maiores do mundo abriu mão de exigir experiência e fornecerá treinamento interno para as 200 vagas abertas esta semana para suas unidades em Jaguariúna e Amparo.- Publicidade –

As oportunidades são nas áreas administrativa, operação e técnica. De acordo com a empresa, as vagas na região representam um terço das 600 disponíveis em suas unidades no Estado de São Paulo. Já uma indústria química de Valinhos está contratando pessoas a partir de 50 anos para preencher os 40 postos abertos na produção. “São pessoas que trazem bagagem, responsabilidade e dedicação, qualidades fundamentais para o nosso dia a dia produtivo”, explicou a diretora Industrial da empresa, Lilian Marescalchi.

Essa é uma faixa etária com dificuldade para ser se manter no mercado de trabalho, mas as barreiras estão caindo. “Esse preconceito existia, continua existindo no mercado, mas o cenário tem mudado. Hoje tem muitas empresas já trazendo pessoas 50+ para dentro de suas organizações, se preocupando em capacitá-las para que possam trazer a sua bagagem, a sua experiência e agregar no time”, disse a especialista em gestão de pessoal Cíntia Ladeira.

SOLUÇÕES

“Diversos setores tradicionais no Brasil, como o varejo, a construção civil e a indústria, vêm enfrentando dificuldades para preencher vagas, em razão da escassez de profissionais disponíveis”, afirmou a CEO de uma empresa de consultoria empresarial, Fernanda Toledo. Para driblarem esse obstáculo, acrescentou, as empresas têm investido em programas de formação interna, parcerias com instituições educacionais e recrutamento de talentos em diferentes regiões ou países. Além disso, estratégias como oferecer benefícios atrativos e planos de carreira têm sido utilizadas para atrair e reter profissionais. De acordo com ela, cargos como desenvolvedores de software, engenheiros especializados, médicos, enfermeiros e especialistas financeiros também estão entre os mais difíceis de preencher atualmente. O trabalho em home office é a alternativa para contratar colaboradores para algumas dessas atividades, mesmo que seja a dezenas ou milhares de quilômetros da sede da empresa.

Levantamento feito pela Secretaria de Trabalho e Renda Campinas identificou 17 funções que, somadas, representaram 348 vagas disponibilizadas no ano passado através do Centro Público de Apoio ao Trabalhador (CPAT), que não tiveram nenhum encaminhamento ao mercado de trabalho. Com a inclusão das vagas que tiveram apenas um ou dois encaminhamentos, o total chega a 612. Entre as profissões que exigem ensino fundamental, médio ou técnico e deixaram de ser preenchidas por falta de interessados estão técnico em atendimento e vendas, operador de máquinas florestais estáticas, soldador elétrico, operador de bobinadeira, inspetor e risco e operador de centro de usinagem de madeira (CNC).

Para o diretor do CPAT, Guilherme Damasceno, o desinteresse está relacionado à queda da taxa de desemprego, que em fevereiro foi de 6,2% no Estado de São Paulo, a menor em 12 anos. Isso leva os trabalhadores a priorizarem buscar empregos com melhores salários, horários mais flexíveis e maiores oportunidades de ascensão profissional. De acordo com Guilherme Damasceno, as vagas com nenhum ou pouco interessados também são uma oportunidade para quem está desempregado fazer um curso profissionalizante ou especialização para se recolocar no mercado.

O ajudante de pedreiro Hyan de Oliveira do Nascimento fez cursos de informática e inglês em busca de oportunidade mais promissora. “Espero conseguir algo logo”, disse. Ele, que no momento está desempregado, só faz uma exigência: o trabalho tem de ser diurno para concluir o ensino médio. O estudante do período noturno está no 2ª ano e aposta na educação para novas portas se abrirem para ele.

OPORTUNIDADES

O CPAT identificou uma outra mudança no mercado de trabalho. “Muitas pessoas estão priorizando abrir o próprio negócio em busca de uma melhor renda”, disse o diretor do órgão. Ele citou como exemplo a função de sushiman. No ano passado, apareceram 16 oportunidades de emprego, mas apenas uma pessoa foi encaminhada para entrevista. Outra é a de gesseiro, que não teve nenhum encaminhamento.

Segundo dados do Novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), sistema do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), em janeiro deste ano, 37,9% dos desligamentos nas empresas foram voluntários, ou seja, a pedido do próprio trabalhador. Os especialistas apontam como os motivos a vontade de trabalhar por conta, os salários baixos oferecidos, rigidez nos horários, questões de saúde mental, falta de ética nas organizações e o surgimento de outras oportunidades mais atrativas.

“Empreender é melhor do que ser empregado”, afirmou o empreiteiro de obras Hildebrando de Lima. Ele trabalhou sete meses com carteira registrada em uma construtora de Campinas, mas pediu as contas para voltar a atuar como autônomo, atividade que exerce há 15 anos. A busca por uma empresa foi para cobrir o vácuo de um curto período sem uma obra para ele mesmo tocar. “Eu ganho mais trabalhando por conta. Hoje, não aconselho nenhum jovem de 18 anos e alguma qualificação [na construção civil] a trabalhar como empregado”, disse Hildebrando de Lima.

Ele citou como o exemplo a função de pintor de obra, que chega entre R$ 2, 95 mil e R$ 4 mil em uma construtora, mas a renda pode atingir os R$ 8 mil se trabalhar por conta. “Se ele for bom e trabalhar direitinho, dá para tirar o dobro”, disse o empreiteiro. No caso de buscar ter o próprio negócio, o CPAT também atua na orientação de como se tornar microempreendedor individual (MEI) e oferece cursos, entre eles como administrar o negócio e definir preços, através de parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). O interessado pode até conseguir um empréstimo, através do Banco do Povo, para investir na nova atividade.

Valdemur Carlos dos Santos pediu demissão do emprego há dois meses para se mudar para Campinas e sonha em conseguir uma recolocação rapidamente. “Aqui tenho casa própria e como se separei da mulher, achei que era melhor voltar”, disse ele. O seu currículo profissional traz experiências como mecânico diesel, montador industrial e o último emprego foi como em uma lavanderia de roupa hospitalar. Ele avaliou a experiência como um diferencial para encontrar um nova vaga e continuar com a carteira assinada. Duas atividades exercidas fazem parte dos setores que mais contrataram na RMC este ano. Juntos, serviços e indústria foram responsáveis por 12.139, o equivalente a 74,67% dos 16.256 novos postos de trabalho criados no acumulado de janeiro e fevereiro deste ano.

Porém, a dificuldade de encontrar mão de obra que atendesse as suas expectativas levou o proprietário de uma oficina mecânica de Campinas a não ter mais funcionários. “Desisti de tentar contratar. O último que trabalhou ficou dois meses e foi embora dizendo que era pesado, estava atrapalhando os estudos. Ele saia às 16 horas e tinha três horas até entrar na escola”, afirmou Adriel Vasconcelos Ferraz. A opção de trabalhar sozinho reduziu a capacidade de atender os clientes e mexeu com o faturamento, mas é uma consequência que ele absorveu. “Quando você contrata mecânicos mais velhos, ele não tem o padrão de serviço esperado”, afirmou o proprietário. A oficina, no Jardim Chapadão, foge da imagem tradicional. O chão é bem limpo, não há ferramentas espalhadas e a organização chama a atenção. “Optei por trabalhar sozinho porque está difícil contratar”, resumiu Adriel Ferraz.

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